Capítulo I
Sem Rumo
Com 32 anos, ela nunca imaginaria que estaria nessa situação. Acorda com sede e ao levantar, sente as dores no corpo. Era um adorável noite de outono, que começava a refrescar as montanhas de Minas. A lua cheia refletia no vidro da janela da sacada e ela levantou sem sequer acender a luz. Era até melhor mesmo, afinal, o foco era permanecer escondida e no lugar que ela estava poderia ser reconhecida. Tomou outro comprimido para dor e deitou novamente, dessa vez, sem sono. Já se faziam três semanas desde o seu sumiço. Foi até fácil planejar tudo, ela é viciada em livros e filmes, além de seriados americanos e, por isso, se escondeu com facilidade. O que Luana não esperava, era de sentir tanta falta daqueles que ela amava.
Mas era preciso tomar essa decisão. Ela estava cansada de fingir estar bem pra que todos ao seu redor não ficassem com pena. E como foi difícil. Ter um câncer no cérebro ao 32 anos não é bem o que uma mulher em plena forma física, espiritual e intelectual espera. Seu emprego fixo como enfermeira chefe estava no seu auge, mesmo que Gustavo não gostasse muito de perdê-la tanto tempo para o emprego.
De repente alguém bate na porta. Seu coração salta acelerado e ela para por instante.
- Quem será uma hora dessas, gente? -Sussurra baixinho.
E novamente outra batida na porta acontece.
- Como será que alguém me achou nessa espelunca?
Realmente era uma espelunca, pois nem no
google era possível achar aquele lugar. Um hotelzinho barato em uma comunidade distante de Ouro Preto não iria chamar atenção - ela pensou.
- Quem é? - Luana pergunta fazendo outra voz mais fina.
- Oi Luana, tenho um recado para você, por favor, abra à porta.
Ela congelou. Alguém batendo na sua porta sabia seu nome verdadeiro e ainda tinha um recado. E aí, será que eu abro ou não?
Mas como o espírito curioso de Luana a dominou, ela abriu a porta impulsivamente. Se deparou com um homem magro, com blusa esfarrapada e ofegante na porta. Ela não o conhecia, mas porque diabos ele estava ali, parado à sua frente?
- Bom, desculpe a hora, mas você não pode fazer isso.
- Quem disse? Pode ir embora, Lucas! Como você me encontrou, caralho?
- Luana, tenho meus recursos, agora deixa eu entrar e conversar com você.
E depois de ter trocado o número de telefone, e-mail e cancelado todas as suas redes sociais, Luana resolveu deixou Lucas entrar. Ele era seu amigo há mais de 10 anos, seu melhor amigo e ela não contou o do câncer, nem da sua fuga para ele. A história dos dois era cheia de altos de baixos, devido à grande intimidade que tinham com o passar dos anos, e por isso, a liberdade também era bem maior.
- Por que você não me contou, Luana? Tá louca?
- Não, não estou louca, tenho um tumor no cérebro, que sonhei que teria quando tinha 28 anos e agora ele resolveu chegar. Não tem tratamento e eu não quero ver ninguém sofrer por minha causa!
Ela tinha descoberto o tumor há 4 semanas e resolveu omitir de todos o seu diagnóstico, inclusive de Lucas. Luana era teimosa. Há quatro anos atrás acordou apavorada de um sonho que estava com câncer em estágio terminal. De lenço, no sonho ela sofria muito por saber da sua morte e ver todos ao seu redor sofrendo. Fizera então uma carta, com todos os detalhes e estava planejando viver seus últimos dias de vida, sem preocupar ninguém. Mas, com seu desaparecimento, Lucas não sabia o que tinha acontecido e começou uma busca particular para encontrar Luana.
A história de Lucas e Luana ia além de só uma bela amizade. Eles se amavam em segredo, mas ambos eram casados com outras pessoas e decidiram não abrir mão de seus compromissos maritais por esse amor, afinal, deveria ser algo de quem não tinha equilíbrio emocional suficiente, ela pensava.
- Entra logo e não diga meu nome! O que está fazendo aqui?
- Luana, eu sei a verdade, nem precisa mentir pra mim.
- E como descobriu? Ela sentou desanimada na cama, tentando arrumar o pijama que tinha vestido as pressas.
- Sua médica me contou. Depois que Gustavo me ligou desesperado, eu fiquei muito apavorado, Luana! Você definitivamente não pode fazer isso!
- Claro que posso! Não quero ver minha família sofrer por minha causa, Lucas, não quero ver você ficar triste porque eu vou morrer, essa é uma escolha minha que deve ser respeitada. Ponto final.
- Querida - ele disse, sentando na cama- você ainda tem tratamento. Pesquisei a respeito a tem boas chances. Porque desistir? Tem tanta gente lutando pela vida e você aí, desistindo. Não faça isso, Luana, volte pra casa.
- Quem veio com você?
- Vim sozinho, eu te conheço, não se preocupe.
- Então vou te explicar, mas gostaria que você me ouvisse, de fato. Pode ser?
- Claro. Tenho todo o tempo do mundo. Comece.